sexta-feira, 1 de setembro de 2017

O ESTUPRO DE DUZENTOS MIL RÉIS



Na última quarta, 30.08, Diego Ferreira de Novais, inicialmente indiciado por estupro, foi libertado após o juiz considerar ausência de constrangimento, violência ou grave ameaça.
Antes de apedrejarmos o Meritíssimo, devemos considerar que o mesmo pautou-se estritamente pela letra da lei, considerando que nem mesmo houve crime, mas mera contravenção. A pena aplicada? Apenas multa. De quanto? Segundo a lei, de 200 mil réis e dois contos de réis. Em valores atuais, qualquer valor que leve em conta a profissão do indiciado (ajudante de serviços gerais).
A título de comparação, quais os demais delitos similares ao praticado pelo contraventor? São, dentre outros: provocação de tumulto leve, perturbação de sossego alheio, vadiagem e rinha de galo.  
E os antecedentes do contraventor? Veja no link:
São nada menos que 16 ocorrências similares (para considerarmos apenas aquelas em que ele foi detido pela polícia).
E quanto às considerações do juiz?
Ele se ateve à letra da lei, razão apontada por seus pares para reclamar das críticas que têm sido dirigidas a ele.
Esquecem-se os poderosos julgadores que para exercer tão nobre função não é necessário simplesmente abrir o Código Penal, identificar o delito, pesquisar a pena e, aberto o Código de Processo Penal verificar os procedimentos derivados.
Para fazer isto bastaria saber ler e escrever. Qualquer um razoavelmente alfabetizado poderia sentar-se naquela cadeira.
Não, para ser juiz é preciso algo mais que os cinco anos de Direito, os dois ou três de pós graduação, outros tantos de doutorado e, além disto, submeter-se a um concurso difícil e altamente concorrido.
É necessário mais que conhecimento. É preciso de discernimento, coerência social, entendimento das variáveis muitas vezes ocultas e psicológicas que acompanham cada caso. Para verificar a existência de constrangimento, violência e ameaça não basta a descrição dos lugares comuns. É preciso sensibilidade acima de tudo.
Constrangimento, em nossos melhores glossários significa também provocar acanhamento ou embaraço.
Violência é o homicídio, a lesão corporal, mas também é o próprio constrangimento no dizer de nossos glossários mais respeitados.
Ameaça, dizem nossos léxicos, é também “manifestação que leva a acreditar na possibilidade de ocorrer alguma coisa notadamente ruim”. Não será o mesmo que constrangimento?
E qual a intensidade desse constrangimento?
É preciso perquirirmos qual o alvo dele. Não é o patrimônio material, o social ou mesmo o profissional. É a intimidade.
E o que é intimidade? É o patrimônio estritamente particular, indevassável sem autorização, aquilo que se mantém resguardado da invasão alheia ou não permitida.
Pela décima sexta vez o contraventor constrangeu a intimidade de alguém, devassou-a somente para atender a seus instintos bestiais. E novamente o judiciário deixou-o livre para praticar, quem sabe, o décimo sétimo.
É preciso mudar muita coisa neste país. No que tange ao Judiciário, trazê-lo ao mesmo patamar daqueles que o buscam para proteger-se das vicissitudes que sofrem no dia a dia. Tirá-lo do Olimpo.
Decisões como essa ofendem a justiça social, mantêm ao desamparo as mulheres que são obrigadas a suportar caladas atos que envergonham a todos, inclusive nós, homens. É precisamente para casos do gênero que servem as cadeias, não somente para aqueles que furtam sacolas de biscoitos em supermercados.
Juízes não são funcionários públicos comuns. São titulares de um Poder e é nessa condição que devem se portar. O que se pede a eles é que pratiquem justiça, que é uma das quatro virtudes cardeais e mãe da dignidade humana.



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