domingo, 11 de julho de 2010

A guerra que o mundo esqueceu

Sílvio Lanna

Em 11 de julho de 1995, há precisos quinze anos, ocorreu o Massacre de Srebrenica, quando mais de 8.000 bósnios muçulmanos (incluindo crianças e adolescentes) foram exterminados na região de Srebrenica, na Bósnia-Herzegovina, pelo exército sérvio.
A tragédia tem proporções similares às patrocinadas pelos nazistas na Segunda Guerra Mundial, incluindo-se no rol dos maiores genocídios já praticados na história da humanidade.
Algumas peculiaridades, entretanto, continuam desafiando o bom senso até o momento. A região do massacre, onde se concentravam mais de quarenta mil muçulmanos refugiados, civis e desarmados, era área mantida sob proteção da ONU, que lá possuía contingente militar. Isso não impediu, entretanto, que as tropas sérvias perpetrassem o ato de selvageria que marcou aquele 11 de julho.
Hoje sabe-se que os membros do Conselho de Segurança da ONU tinham informações de que a invasão sérvia era iminente e do altíssimo risco corrido pela população tutelada pelo órgão internacional. Também é verdade que, em face de tal situação alguns oficiais do exército da ONU sugeriram ataque aéreo como forma de impedir o massacre que se anunciava. Porém o governo holandes postou-se contra, impedindo a medida. Sem voz de comando específica para o enfrentamento dos invasores, os capacetes azuis teriam assistido passivamente ao genocídio, contribuindo com sua inércia para a sentença de morte assinada pelo comandante sérvio, general Ratko Mladic, até hoje foragido, e pelo líder sérvio da Bósnia, Radovan Karadzic, atualmente sob custódia do Tribunal Penal Internacional.
Karadzic, que dispensou advogado, assumindo sua própria defesa, alega que o genocídio não passa de um mito, apesar das evidências constituídas pelos milhares de corpos sepultados em valas comuns. Contra ele pesa ainda a acusação de que teria causado a morte de outras doze mil pessoas (em sua maioria civis), como comandante do cerco a Sarajevo, mantido durante quase quatro anos (de abril de 1992 a fevereiro de 1996).
A Guerra da Bósnia, que possibilitou tamanhas crueldades produziu cerca de duzentos e cinquenta mil mortos e aproximadamente dois milhões de desterrados e refugiados.
Os conflitos internos na ex-Iugoslávia são seculares, envolvendo povos que cultivaram animosidades entre si no decorrer da história, como os sérvios (cristãos ortodoxos), croatas (católicos romanos) e bósnios (muçulmanos). Esses povos constituíram seis regiões distintas e que formavam a unidade iugoslava: Sérvia (incluindo Kosovo e Voivodina), Croácia, Eslovênia, Montenegro, Bósnia e Herzegovina e Macedônia.
A união nacional foi mantida durante o domínio soviético e capitaneada pelo General Tito, até seu falecimento em 1980. A partir daí as rivalidades recrudesceram até que em 1987 estourou a guerra civil que culminaria pelo esfacelamento nacional e pela divisão do país que permanece até hoje.
Duas particularidades despontam no conflito: a conduta vacilante e muitas vezes inerte da ONU e o desinteresse das grandes potências (EUA e países europeus) pelo conflito e pelos atos de crueldade cometidos.
Os Estados Unidos não teriam mesmo qualquer incentivo para se interessarem pelo futuro da região. Afinal, lá não se produz petróleo e nem outros bens interessantes sob o aspecto econômico. Além disto, a possibilidade de lá cravarem uma base militar ou parte do escudo de mísseis há muito planejado (e recentemente negociado com o governo polonês) era irrisória em função da ainda persistente influência russa na região. Portanto, nem a diplomacia e nem os marines foram destacados para acompanhar ou para intervir no conflito. E o genocídio foi consumado sob os olhares complacentes da ONU e dos EUA.
Com relação às potências européias, viram-se constrangidas também a intervir em razão de questões que julgaram difíceis de contornar. Por um lado, a existência de alguns países de postura historicamente antagônica no apoio, uns aos bónios e outros aos sérvios. Por outro lado, temiam também que sua intervenção contra os massacres pudesse "importar" o conflito para dentro de suas fronteiras. Portanto, melhor seria não intervir na carnificina, em uma postura de "lavar as mãos" que reflete evidente covardia e, por que não dizer, cumplicidade.
A mídia, por sua vez, considerando não contar com os interesses e patrocínios dos Estados Unidos e da Europa, também relegou a segundo plano o conflito iugoslavo, cujas notícias foram parar no baú do esquecimento.

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