terça-feira, 17 de março de 2020

JOHN MAYNARD KEYNES - O RETORNO




Para os economistas, Keynes é figurinha carimbada. Não houve acadêmico nas ciências econômicas, notadamente os que lá estiveram nos conturbados anos 80 (eu, por exemplo) que não mergulhasse na obra desse inglês. Ponto de referência para os estudos que se desenvolveram a partir dos anos 30, General theory of employment, interest and money, foi sua obra vorazmente dissecada, principalmente por aqueles que não cultuavam o liberalismo de Adam Smith e seu The Wealth of Nations.
Não era somente uma luta entre as ideias iluministas e o pensamento modernizante do século 20. Mais que isto, o embate foi uma tomada de posição entre a autorregulação do mercado e a importância do Estado na condução da economia.
Para Smith o mercado era uma espécie de Hidra de Lerna com suas incontáveis cabeças que ajustavam todos os elementos constitutivos da economia. Emprego? Salários? Produção? Tudo se ajeitaria com o movimento às vezes sísmico dos agentes econômicos de per si, em mágica coordenação.
Eis que o crack da bolsa de Nova Iorque em 1930 espalhou a crise econômica por boa parte do mundo. Podemos teorizar que se a globalização dos mercados operasse naquele momento (como hoje ocorre), os impactos negativos teriam proporções ainda mais catastróficas. Basta vermos o temor de recessão mundial hoje alardeado por força da pandemia do Covid 19, em uma economia que atrelou nações mundo afora. Os teóricos liberais, que dantes buscavam colher somente louros dessa integração, vêm-se na expectativa de também colher os malogros.
As ideias intervencionistas do keynesianismo foram a solução adotada pelas grandes nações mundo afora para enfrentarem uma crise que se avizinhava global (sem globalização) nos anos 30.
O pressuposto é que o Estado, agente maior da economia, injetaria recursos financeiros dotando os agentes econômicos de condições para manter ou reiniciar o giro do mercado. Não era mais a Hidra, portanto, que agitaria suas nervosas cabeças na regulação automática do mercado. Ele estava doente e carecia de intervenção externa. Keynes venceu.  
É irônico que em um mundo – e um Brasil – em grande parte imerso em brutal liberalismo à moda de Smith e sob o jugo globalizante dos modos de produção vejamos ressurgir o velho Maynard.
Mais uma vez percebemos que a grandeza e a autodeterminação do mercado não são tão pujantes assim. E lá vem o Estado novamente em socorro da iniciativa privada, sob pena de uma quebra geral muito mais ampla do que a ocorrida nos primórdios do século XX. Vejamos:
Na Espanha as dívidas fiscais estão sendo adiadas por 6 meses e linhas de crédito subsidiadas estão sendo ofertadas principalmente ao setor de turismo. Isto no aguardo de um pacote muito maior que será brevemente anunciado.
Na Itália, o Estado alocará bilhões de euros na ajuda de famílias necessitadas e/ou desempregadas pela crise. Contas de luz e similares, além de hipotecas e impostos têm seus vencimentos suspensos temporariamente. Tudo isto sob a promessa de outras medidas de porte a seguir.
Em Portugal o governo vai aportar recursos financeiros aos trabalhadores que necessitem permanecer em suas contas em razão do vírus. Em nível empresarial, serão estabelecidas linhas de crédito excepcionais para atendimento notadamente às empresas de turismo, além da suspensão de obrigações fiscais e outras .
Na França a manutenção dos trabalhadores em casa será parcialmente custeada pelo Estado. Linhas de crédito subsidiadas também serão disponibilizadas ao mercado. Novas medidas de porte estão ainda sendo anunciadas.
Nos EUA, Estado liberal por excelência, o governo promete enviar cheques àqueles que houverem sido afetados pela crise na saúde, replicada na economia. Bilhões de dólares são prometidos em injeções na economia, setoriais ou não, no enfrentamento da recessão que se avizinha.
No Brasil, lamentavelmente as medidas anunciadas pelo czar da economia são tímidas, limitando-se à transferência de recursos de apropriados no mercado financeiro, como liberação de cotas do FGTS. A antecipação de parcelas do 13º também é medida que aloca recursos que já estão aprovisionados obrigatoriamente por imposição do orçamento fiscal. Nada de novo. Aqui Smith permanece impávido.
Em nossos sertões urbanos os Chicago Boys surgidos após os anos 70 retornaram com força total nos anos 2000. Mas isto já é conversa para outro post. Por ora, ficaremos no curto prazo, moda imposta pela terrível pandemia que se alastrou pelo mundo capitalista, partindo da China (?).
Terá sido uma doença do capital?
É como no pensamento de Keynes:
“O capitalismo é a crença mais estarrecedora de que o mais insignificante dos homens fará a mais insignificante das coisas para o bem de todos.”

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